Casa de Criadores 56: Novas vozes e narrativas na moda brasileira

Com espírito de disrupção e foco em novas narrativas, a 56ª Casa de Criadores reuniu nomes consolidados e novas apostas, combinando pesquisa estética, discurso cultural e inovação técnica para fortalecer a moda independente brasileira.

Moda // Other Side
por Caíque Nucci
Agosto, 2025

A 56ª edição da Casa de Criadores se consolidou como um marco no calendário da moda brasileira, reafirmando o evento como vitrine de novas vozes, narrativas e experimentações. Nesta temporada, a passarela reuniu criações que tratam a moda como ferramenta cultural, política e estética, em constante reinvenção. Dos dramas históricos às provocações identitárias, passando por resgates afetivos e experimentações tecnológicas, cada marca apresentou novas possibilidades para o vestir e reforçou a pluralidade como força criativa.

Rober Dognani

Com seu drama característico, Rober Dognani revisita memórias familiares para construir um desfile teatral, atravessado por referências vitorianas, hispânicas e vampirescas. Entre veludos, babados e crinolinas, o estilista mantém o domínio técnico e a intensidade visual, explorando colaborações e texturas que ampliam sua assinatura. O desfile é um retorno simbólico ao Velho Continente, costurando história pessoal, referências artísticas e a dramaturgia que marca sua trajetória.

Casa Paganini

Em sua estreia na Casa de Criadores, Guilherme Paganini apresenta “Raízes”, coleção que une rigor de construção e afeto ancestral. Inspirado por sua família e pelas tradições do Espírito Santo, o estilista traz renda filé, biojoias e bolsas de tear manual, mesclando formas arquitetônicas a materiais de forte carga simbólica. Com referências japonesas e uma paleta que remete à natureza brasileira, a coleção afirma um fazer consciente e de tempo estendido, valorizando o trabalho manual como gesto político.

Lucas Caslú

“Experimentos” nasce de uma imersão no próprio arquivo criativo de Lucas Caslú, onde croquis antigos e peças passadas se encontram em novas combinações. A coleção aposta em contrastes de textura e volume, unindo tecidos leves e estruturados, estampas e elementos artesanais. Inspirado pelo cotidiano urbano de Goiânia e pelas relações humanas, o desfile traduz o vestir como ato expressivo, em que a moda dialoga com a arte para ampliar seu potencial de transformação.

Guilherme Dutra

Em “Poupées”, Guilherme Dutra parte de lembranças afetivas de seus avós para criar um encontro entre a delicadeza da feminilidade e o rigor da alfaiataria. Entre rendas, vestidos florais e estruturas masculinas reinterpretadas, a coleção se constrói como um ritual de memória. Ao transitar entre o masculino e o feminino, o estilista reafirma a moda como território de afeto e reinvenção, onde a herança se transforma em gesto contemporâneo.

Erico Valença

“Adiaû” marca a transição de assinatura da marca e explora narrativas de ficção científica com olhar construtivista e minimalista. A coleção parte de uma premissa de desconforto climático imposto, resultando em peças invernais para um planeta quente. Com alfaiataria geométrica, faux-leather artesanal e uso de tecnologias como 3D e IA no processo criativo, o desfile questiona a relação entre moda, tecnologia e sobrevivência, sem abrir mão do rigor de construção e da produção sustentável.

Plataforma Açu

Com “VO RO NÓI”, a plataforma Açu mergulha em um imaginário biofuturista inspirado no micélio e nas redes que sustentam a vida. Entre tricôs orgânicos, escultura têxtil e impressão 3D, a coleção constrói formas disformes e oníricas, rejeitando a linearidade da moda convencional. É uma fusão entre estética queer, tecnologia e natureza, que propõe novos imaginários e abraça a imperfeição como linguagem visual.

Vittor Sinistra

“Clímax” transforma a passarela em uma festa de experimentação. Vittor Sinistra cria looks para um elenco imaginário de convidados, com técnicas diversas, reaproveitamento de resíduos e forte presença manual. A coleção expande o caráter lúdico e performático do estilista, reafirmando a moda como espaço de liberdade, provocação e construção identitária.

Shitsurei

Marcella Maiumi apresenta “Objeto Desconhecido”, um comentário crítico sobre a fetichização e o não pertencimento impostos a corpos amarelos femininos. Inspirada no sci-fi e na estética space age dos anos 60, a coleção combina elementos de sua ancestralidade japonesa a referências de corrida espacial e feminismo, criando um diálogo entre ironia, desconforto e afirmação. A pintura manual e o trabalho têxtil artesanal reforçam a força autoral da marca.

Jacobina

Em “Névoa”, Raphael Aquino constrói um tributo a mulheres negras cuja memória foi silenciada pela história oficial. Tecidos em camadas, paleta escura e símbolos como lírios evocam delicadeza e resistência, transformando apagamento em presença. A colaboração com a artista Lucélia Maciel acrescenta camadas visuais de memória e afeto, resultando em um desfile que sussurra e resiste ao mesmo tempo.

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