Convidamos Giu (CE) e Priscila Bispo (BA), duas beauty artist baseadas atualmente em São Paulo, para refletirmos sobre as dualidades da beleza e entender melhor o que há de belo em apostar no real
A ideia de beleza já esteve ligada a uma essência objetiva da natureza. Acreditava-se que a beleza era uma característica essencial das coisas. Com o passar do tempo, essa essência passou a ser vista como uma representação do sujeito, um flerte com um compromisso individual em si. A era da metafísica dogmática parece ter voltado à moda e se vivem tempos de uma nova tentativa de colocar o sujeito não mais como centralidade de tudo, mas como caminho.
Convidamos Giu (CE) e Priscila Bispo (BA), duas beauty artist baseadas atualmente em São Paulo, para refletirmos sobre as dualidades da beleza e entender melhor o que há de belo em apostar no real, mesmo num contexto que nos levam a existir em esferas que, por muita vezes, parecem fazer o movimento contrário: um asfaltamento continuo em perceber beleza em somente ser.
Pri e Giu, vocês consideram a beleza algo mais subjetivo ou objetivo?
[Giu] São muitos os conceitos de beleza. Para mim a beleza é mais subjetiva. As referências de beleza que eu tenho são as pessoas da minha família, da cidade que eu vim, as coisas que mexiam comigo lá, as coisas que eu assisti quando era criança. E isso é extremamente subjetivo e extremamente meu. Não tem como repetir, só eu tenho acesso a esse lugar.
[Pri] Não dá para encaixar a beleza apenas na subjetividade ou em algo objetivo. Minhas criações vem da memória, da minha mãe e isso tudo constrói minhas referências subjetivas. Mas eu preciso ser objetiva no que comunico, ser mais direta me permite consolidar caminhos do legado que eu quero deixar. Então mesmo que eu caminhe pelas subjetividades, ainda considero que para mim, a beleza é objetiva.
Giu, para você, o que é apostar no seu real dentro do mercado?
Quando você é uma pessoa que já transitou por alguns espaços e que nem sempre entenderam a estética do seu trabalho, eu sinto que o mais urgente para ser real é produzir algo que tenha arte envolvida. Eu não aguentava ser colocada para fazer maquiagens que beiravam o social, ainda que eu quisesse fazer uma coisa muito mais bonita ali. Hoje entendo que em São Paulo, por exemplo, eu posso me juntar com meus amigos para fazer coisas e mostrar para as marcas: “olha, é isso aqui que eu faço". Apostar no que eu quero ser e como quero ser vista a partir disso.
Apesar dessa vantagem, eu sinto que em Fortaleza eu criava mais. Na lógica de São Paulo o erro não faz parte da equação de criar. Quando se aposta na lógica da beleza por referências e não pela criação, estamos sujeitos a esse tipo de resultado. Então para mim saber transitar nessa lógica, criar, se permitir a errar, envolver arte, meu olhar, minhas origens e o outro (seja o cliente ou uma artista) é apostar no meu real dentro do mercado e isso é bonito.
Pri, na sua opinião tem diferença entre ser maquiadora e beauty artist?
Sim, existe. Existem muitos lugares na maquiagem, e a maquiagem em si se manifesta muito no que a moda pode proporcionar visualmente. Para a pessoa beauty artist, a maquiagem sai desse lugar meramente visual e parte para um local de significado e, por consequência, de ressignificação. Vai além. O que eu quero comunicar com esse cabelo? Com essa pele? De que formas e jeitos eu posso seguir para que se crie algo além disso aqui que estou apresentando?
No meu processo criativo eu aposto muito no natural. Hoje eu penso a beleza em uma esfera além da maquiagem, então é apostando no natural e no mais próximo do real que eu posso criar com o que a pessoa de fato é e só potencializa isso a partir do meu trabalho.
Giu, como é criar trabalhando com beleza, você cria enquanto trabalha?
Humm, difícil, mas eu acredito que eu crio sim enquanto trabalho. Às vezes acontece de você ter tudo batido, tudo organizado, sabendo quais caminhos a make e o cabelo devem seguir, e quando chega na hora, você percebe que aquilo ali não está funcionando. O fluxo da beleza às vezes nos surpreende e precisamos criar em cima de novas soluções.
É aqui que se precisa ter um olhar calibrado entre o que você gosta esteticamente, o que você é enquanto profissional de maquiagem e beleza - porque não dá pra fugir do que é belo no mundo da beleza - e o que é preciso entregar, então são nesses momentos que eu crio. Quando eu olho e penso com toda a bagagem que eu tenho desde que nasci até o momento atual: qual é a solução mais bonita para isso?
Pri e Giu, o que vocês diriam para beauty artists e profissionais criativos que estão apostando cada vez mais em ser autênticos e conscientes das suas singularidades?
[Giu] As referências já estão em você. O seu trabalho vai ser extremamente único, por mais que você se inspire em outros artistas. É importante ter confiança, porque se você não acreditar no seu trabalho, quem vai? Eu sou muito agradecida pelas pessoas que acreditaram em mim.
Recentemente, estava vendo uma lembrança do instagram de uma publicação que eu fiz logo depois de ter saído do clipe de Baila Comigo da Selena Gomez, no qual eu assinei à beleza, com a frase "obrigada a todo mundo que acreditou em mim, quando nem eu mesma acreditei". Isso é muito forte. Quando eu tomei consciência da importância de acreditar em mim e no meu trabalho, tudo mudou.
[Pri] O tempo de bagagem é muito importante. Apesar de considerar que as coisas aconteceram rápido para mim, eu entendo o quão valioso é carregar sua história e o que você acredita. Ser único e autêntico te aproxima mais de se tornar uma referência. Quando você escolhe realmente querer ser vista, dá trabalho, mas é recompensador.
As discussões sobre a beleza são muitas e é impossível não devanear sobre esse tema. Nossa proposta é refletir o que de fato nos aproxima de entender a beleza pelo que ela é, seja nos momentos de mais objetividade ou subjetividade, no artificial ou no natural. Giu e Pri mostram que a originalidade e a autenticidade podem nos levar longe e que apostar nisso pode ser a coisa mais real e bonita que podemos fazer por nós.
Giu é beauty artist, tem 31 anos. Cearense baseada em São Paulo e assina a beleza para artistas como Rachel Reis, Céu e Valentina Bandeira. Conheça mais, @giumaquiadora.
Pri é beauty artist, tem 30 anos. Baiana baseada em São Paulo, já assinou a beleza para Mc Carol, Iza e Malu Camargo. Conheça mais, @priscilabispobeauty.