A coleção “The Tree is Your Spine”, da marca brasileira P. Andrade em colaboração com o artista Samuel de Saboia, não apenas propõe essas perguntas, ela as veste. Em sua estreia histórica na Semana de Moda Masculina de Paris, a coleção é um manifesto ecológico e espiritual travestido de design.
E se o antídoto para o apocalipse não estivesse nos bunkers de bilionários, mas em uma jaqueta tingida com bactérias nativas? E se, ao invés de mirar foguetes para Marte, olhássemos com reverência para os fungos sob nossos pés, para as rendas que narram histórias invisíveis, para os códigos que traduzem a vida em matéria digital e espiritual?
A coleção “The Tree is Your Spine”, da marca brasileira P. Andrade em colaboração com o artista Samuel de Saboia, não apenas propõe essas perguntas, ela as veste. Em sua estreia histórica na Semana de Moda Masculina de Paris, a coleção é um manifesto ecológico e espiritual travestido de design. Com tecidos bio-tingidos, formas orgânicas e símbolos esotéricos bordados em algoritmos e renda nordestina, ela insinua um novo modo de habitar o futuro: um onde o corpo é extensão da terra, e a roupa, uma segunda pele do planeta.
À primeira vista, a coleção parece falar em línguas opostas, espiritualidade e blockchain, streetwear e microbiologia, Puma e Kundalini. Mas tudo converge para um mesmo ponto de tensão: como criar moda diante do colapso? Como regenerar, e não apenas adornar?
Essa tensão ecoa o universo da animação “Nausicaä of the Valley of the Wind”, de Hayao Miyazaki. No filme, o mundo vive pós-desastre, engolido por uma floresta tóxica habitada por insetos monstruosos. A heroína, Nausicaä, não tenta destruir o que é estranho. Ela aprende a escutar. Em vez de combater a floresta, ela entende que é justamente ela quem está limpando a terra — o que parecia ameaça era, na verdade, cura..
Como Nausicaä, a coleção de P. Andrade rejeita a lógica do inimigo. O design aqui não tenta controlar a natureza, mas colaborar com ela. As roupas, tingidas com bactérias, inspiradas em fungos, tecidos como organismos vivos, são o oposto da estética da dominação. São vestígios de um novo luxo: aquele que não esgota, que não polui, que não esconde a mão. O luxo do tempo lento, da vida em simbiose, da moda que escuta antes de falar.
E assim como Nausicaä atravessa a floresta sem trajes de proteção, confiando no próprio corpo como ponte entre mundos, “The Tree is Your Spine” propõe um vestir radicalmente sensível. A coluna vertebral torna-se árvore. O humano, ecossistema. A moda, rito de passagem.
Ao integrar o passado ancestral com tecnologias regenerativas, a coleção sugere que ainda há tempo. Tempo de mudar os códigos e reencantar o tecido do mundo. Porque talvez não precisemos de novos planetas, nem de novas guerras, mas sim de novas linguagens para desenhar o possível.
E se, como Nausicaä, nos tornarmos aquela figura azul, a que atravessa mundos, conecta espécies e planta, no lugar da destruição, uma nova floresta de esperança?