SPFW N60: Boldstrap

Conhecida por transformar o fetichismo em linguagem estética e a sensualidade em ferramenta de afirmação política, a etiqueta apresenta sua nova coleção de alto verão explorando as fronteiras entre o desejo e o desconforto, entre o litoral e a cidade.

Moda // Other Side
por Sarah Rocksane Araújo
Outubro, 2025

A Boldstrap, marca comandada por Peu Andrade, chega à 60ª edição da São Paulo Fashion Week reafirmando sua vocação para provocar. Conhecida por transformar o fetichismo em linguagem estética e a sensualidade em ferramenta de afirmação política, a etiqueta apresenta sua nova coleção de alto verão explorando as fronteiras entre o desejo e o desconforto, entre o litoral e a cidade. O desfile propõe uma narrativa que traduz a rotina das férias, essa alternância entre o dia ensolarado e a noite sem fim, como uma performance contínua de exposição corporal e liberdade pessoal.

A proposta se descola das leituras mais óbvias do verão. Não há biquínis ou sungas como ponto de partida, mas uma reflexão sobre o vestir em movimento, sobre o corpo que transita entre diferentes espaços, carregando o sal, o suor e o brilho como ornamentos. As peças cruzam referências de praia, balada e cotidiano urbano com a ironia e o hedonismo que são marca registrada da Boldstrap. O ponto de partida visual vem das estampas criadas pelo ilustrador russo Draw Me Denis, artista gay que vive na China em exílio autoimposto, fugindo da repressão política de seu país. Seu traço mistura erotismo digital e natureza tropical, criando uma iconografia quente, vibrante e subversiva. Os desenhos aparecem em cangas, camisetas e shorts, funcionando como um elo entre o verão e as festas, entre o corpo real e o corpo virtual.

Peu Andrade revisita materiais já conhecidos da marca (látex, seda e tecidos planos) mas amplia suas possibilidades, abandonando em parte o uso das malhas para experimentar texturas, brilhos e transparências. O látex, que nas coleções anteriores simbolizava o fetiche urbano, agora ganha tratamento solar: surge em versões com aplicações 3D, estampas e efeitos de superfície que remetem à pele aquecida, ao toque do sol. Já o paetê transparente, um dos protagonistas da coleção, opera como metáfora do corpo iluminado — aquele que se mostra e se esconde, como uma imagem censurada na era digital. A coleção alterna momentos de frescor e intensidade. Há bermudas de surfe, biquínis cortininha e microssungas que reinterpretam os códigos do esporte e da praia, combinados a baby looks com as cores saturadas do pôr do sol. Em contraste, surgem vestidos bandage, corsets estruturados, jeans rasgados que revelam calcinhas asa-delta e tops com brilho cintilante, reafirmando a sensualidade noturna que marca a identidade da Boldstrap.

Essa tensão entre o esportivo e o glamouroso é um dos fios condutores da narrativa visual. A coleção parece propor uma “democratização do fetiche”: o luxo se dá não pelo inacessível, mas pelo gesto livre de vestir-se como se quisesse celebrar a própria pele. O uso de bordados, pedrarias e viscose traz sofisticação às silhuetas inspiradas em skatistas e surfistas dos anos 2000, mesclando ingenuidade juvenil e desejo adulto. O resultado é um repertório híbrido, entre o streetwear e a performance, entre o desejo pop e a crítica ao moralismo.

IMAGENS PASSARELA 

Créditos: Gabriel Cappelletti/ Marcelo Soubhia / Marcelo Soubhia /Ze Takahashi @agfotosite

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