Aftershock de James Turrell: o desaparecimento da matéria na cor

Em Aftershock, o visitante sobe degraus que remetem a um templo e entra em um ambiente onde cor e luz preenchem completamente o espaço. Não há foco, não há direção.

Design // Art-time
Por Gilles Pedroza Leite
Junho, 2025

Com a instalação Aftershock, apresentada no Copenhagen Contemporary, o artista norte-americano James Turrell reafirma sua posição como um dos nomes mais radicais da arte contemporânea. Conhecido por transformar luz em matéria e percepção em linguagem, Turrell constrói espaços imersivos onde a arquitetura parece evaporar. Em Aftershock, o visitante sobe degraus que remetem a um templo e entra em um ambiente onde cor e luz preenchem completamente o espaço. Não há foco, não há direção. A experiência é de imersão total, como se os sentidos fossem suspensos em uma névoa cromática em constante mutação.

A obra faz parte da série Ganzfeld, nome derivado de um conceito da psicologia da percepção que descreve estados provocados por estímulos visuais intensos e uniformes. Turrell utiliza esse efeito para desafiar os limites do olhar. Em Aftershock, tons como fúcsia, laranja e azul se sucedem lentamente, criando um campo de cor contínuo que desorienta a visão e dissolve as fronteiras do espaço. O resultado é uma sensação de flutuação: o espectador perde a noção de profundidade e, em alguns momentos, chega a duvidar se seus olhos estão abertos ou fechados. É o tipo de experiência que exige tempo e entrega um contraponto potente à velocidade das imagens contemporâneas.

Aftershock é uma declaração sobre a relação entre corpo, luz e espaço. Ao longo de cinco décadas, Turrell tem se dedicado a investigar a luz como material e fenômeno influenciado tanto pela psicologia da percepção quanto por sua formação quaker, que valoriza a ideia de uma “luz interior”. Sua obra não depende de símbolos nem de narrativas. Ao contrário: é na ausência deles que seu trabalho ganha força. Em um mundo saturado de imagens, Aftershock propõe um retorno ao essencial. Turrell nos lembra que ver é, antes de tudo, uma experiência íntima, e que a luz, quando bem trabalhada, pode ser tão poderosa quanto a matéria.

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